Casa do forno, onde há a farinhada
Quem é maranhense, sabe. Farinha na mesa é coisa
sagrada. "O maranhense gosta muito de farinha, né? É o pirão mesmo, só em
cima do arroz, de qualquer jeito, o maranhense gosta de farinha", disse o
comerciante João Crescêncio. "Se eu olhar o arroz na mesa e não tiver a
farinha, não me satisfaz.
Agora, se tiver a farinha e não tiver o arroz,
eu como", revelou o carpinteiro Manoel da Conceição Soares.
Apreciada como sempre, cara como nunca. "Tá
caro de exagerado. A gente lamenta, infelizmente, foi uma crise das plantações.
Realmente aqui no Maranhão tão até parando de plantar", contou o vendedor
Antônio Soares.
Pinheiro tem a fama de produzir uma das farinhas
mais saborosas do estado. Além disso, é um dos maiores produtores maranhenses.
Mas, até por lá, o quilo da farinha "está custando o olho da cara",
como costuma dizer o povo da região. "Essa é biriba. Tá R$ 10,00.
Essa comum aqui tá R$ 8,00", disse o comerciante José de Ribamar Menezes.
Os produtores dizem que é a maior alta dos
últimos 20 anos. A explicação para o aumento está na cadeia produtiva e vários
fatores explicam. Um deles é a estiagem, que começou cedo e se prolongou por
muito mais tempo. Faltou chuva e a mandioca não cresceu o quanto o produtor
esperava.
O produtor Edvan Silva plantou a mandioca em
agosto do ano passado. Como é um plantio mecanizado, esperava colher já em
março. Mas a chuva não veio como ele esperava. "Cheio de esperança. Tava
chovendo bastante, aí depois que eu plantei, a chuva desapareceu. Aí nasceu uma
parte. A outra parte, eu plantei novamente, quando choveu um pouquinho",
disse.
Farinha Biriba
Edvan arranca uma maniva para nos mostrar como a
raiz se desenvolveu e a constatação não é animadora. "Aí, ó. Se tivesse a
chuva? Se tivesse a chuva, essa aqui tava boa", lamentou.
Nas casas de forno, os tanques estão quase todos
vazios e o número reduzido de gente trabalhando também mostra o quanto a
mandioca está em falta. Para o lavrador Francisco dos Santos Abreu, além da
chuva, falta gente para trabalhar na lavoura, assistência técnica e incentivo
para os assentamentos. "Antes tinha muito projeto aí. O Incra investiu em
muito projeto. Deu uns dois anos, aí que deu muita farinha, mas depois o
pessoal foi abandonando os projetos", contou.
Segundo o lavrador, é por falta de bons
resultados na roça que os homens da região estão abandonando a lavoura para
trabalhar em grandes obras pelo país a fora. "Tão tudo trabalhando em
firma. Os mais novo tão tudo no mundo. Eu mesmo, os que trabalhava comigo,
foram tudo embora", explicou.
Os lavradores ainda enfrentam outro problema. A
chuva alternada com sol intenso e temperaturas altas favorecem o
desenvolvimento de um tipo de fungo que causa a podridão da mandioca. As que
não apodrecem, perdem a qualidade.
A qualidade da mandioca influencia diretamente
no preço da farinha. Quando ela está boa, a massa é consistente. O
produtor precisa de, no máximo, 100 quilos de mandioca para produzir 30 quilos
de farinha. Quando caem as primeiras chuvas, a coisa muda totalmente de figura.
Metade da massa se transforma em água. Os produtores costumam dizer que a
mandioca está "degenerada". Com isso, para produzir os mesmos 30
quilos, a quantidade de polpa dobra.
Mandioca e Milho na região Tutóia - 2011
"No verão, a gente bota 100 quilos de
mandioca para fazer 30 quilos de farinha. Hoje, a gente bota uma base 200
quilos de mandioca pra dar 30 quilos de farinha. Aí, a gente perde muito por
isso, mas o que a gente vai fazer? A gente depende da mandioca pra sobreviver e
isso vai da natureza", diz o lavrador.
Porão dos Pirrós é o maior produtor de farinha
biriba da região. Na época da boa safra, que vai de maio até outubro, chega a
produzir 30 toneladas de farinha por mês. Agora, a produção caiu pela metade.
"Isso é uma coisa que deixa a gente preocupado. Nós temos hoje três
agroindústria no Porão dos Pirrós, pra nós manter elas funcionando e vender pra
cidade de Pinheiro, Santa Helena, enfim, na baixada e capital. Estamos usando a
pouca que nós temos e tamo buscando nos povoados que não são assentamentos e
também nos municípios vizinhos", revelou o produtor.
Se a farinha é pouca e a procura é grande, o
preço vai para as alturas. Em dezembro, os valores começaram a subir e não
pararam mais. Para o lavrador Joacy dos Santos Vieira, é uma oportunidade de
pagar as contas. "Ajuda nas despesas da gente, financeira, que a gente tá
devendo uma continha. Por causa do preço, a gente corre e vai acertar as contas
da gente, mas, por outro lado, eu acho que a gente perde muito mais",
disse.
Assim, a farinha, que já foi comida de pobre,
está virando artigo de luxo.
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